segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Dois bilhetes para um filme de amor que não viste comigo




Lê , são estes os nomes das coisas que
 deixaste – eu, livros, o teu perfume 
espalhado pelo quarto; sonhos pela
 metade e dor em dobro, beijos por
 todo o corpo como cortes profundos 
que nunca vão sarar; e livros, saudade, 
a chave de uma casa que nunca foi a 
nossa, um roupão de flanela azul que
 tenho vestido enquanto faço esta lista: 
 livros, risos que não consigo arrumar, 
e raiva – um vaso de orquídeas que 
amavas tanto sem eu saber porquê e 
que talvez por isso não voltei a regar; e
 livros, a cama desfeita por tantos dias, 
 uma carta sobre a tua almofada e tanto
 desgosto, tanta solidão; e numa gaveta 
dois bilhetes para um filme de amor que
 não viste comigo, e mais livros, e também 
uma camisa desbotada com que durmo
 de noite para estar mais perto de ti; e, por
 todo o lado, livros, tantos livros, tantas
 palavras que nunca me disseste antes da 
carta que escreveste nessa manhã, e eu, 
 eu que ainda acredito que vais voltar, que 
voltas, mesmo que seja só pelos teus livros 






 Maria do Rosário Pedreira
 (Foto de Ezgi Polat)