domingo, 11 de setembro de 2016




Disseste que se via nos olhos. Que nem um sorriso conseguia esconder. Que me vias, assim. Perdoa-me também; porque eu reparei nos teus olhos. E não esqueço gestos. Por exemplo: quando levaste a mão ao peito como se não conseguisses respirar. Ouvias esta música. Já não te recordas, eu sei. Disfarçaste. Ainda hoje me espanto com o que aguento lembrar. Por exemplo: quando chorei abraçada a ti. Foi assim que nunca mais abandonei o teu cheiro. Mas tu voltaste a dizer que se via nos olhos e eu – o tanto que tentei – só queria enganar-te. Cedi. Não sei bem o que viste. Sei que te arrastei no meu silêncio. Que me acalmou a tua respiração acelerada. Ou a tua mão no meu cabelo. Beijaste-me em prenúncio de tragédia. Não interessa agora. O que aconteceu? A memória será o meu calvário. E isso – tu sempre soubeste – vê-se nos olhos. Tomara eu sabê-lo tão bem: talvez ainda tivesse tempo de fugir. 






 Rafael Alberti